Quando o governo federal anunciar qual será o novo caça da FAB (Força Aérea Brasileira), em meados de março, a novela do negócio estimado em US$ 700 milhões não terá chegado ao fim. Ao contrário, estará só começando.

A concorrência F-X, como o negócio é chamado na FAB, chega ao seu final exatamente como começou: com uma interrogação sobre o papel reservado à Embraer, a principal empresa aeronáutica do país.

Segundo os três concorrentes da Embraer, todos são unânimes: querem uma associação com a Embraer para a integração do novo caça caso ganhem a F-X.

Eles foram estimulados pelas palavras do ministro da Defesa, José Viegas, que há três semanas afirmou que a indústria nacional irá participar do processo de aquisição do novo avião, qualquer que seja o vencedor.

Só que esse cenário embute um problema que vem passando ao largo das análises sobre a licitação. Uma das exigências da FAB na F-X é que o vencedor passe ao Brasil toda a tecnologia do avião, em especial os códigos-fonte dos softwares que o controlam e a seus sistemas de armamentos.

Se o governo quer a indústria aeronáutica brasileira participando dessa transferência, a chamada integração, a Embraer é hoje a única candidata séria ao trabalho.

Integração é um serviço caríssimo. É preciso montar uma espécie de simulador de todos os computadores e sistemas do avião que vai sendo analisado, passo a passo, pelos técnicos que o adaptam para eventuais exigências da Força Aérea. Isso fora o estudo de manuais detalhando tudo.

Ficam então duas dúvidas: se a vitoriosa vai querer ver os segredos do seu avião sendo abertos para uma concorrente derrotada e quanto a Embraer vai cobrar pelo trabalho. Para trocar a aviônica (equipamentos elétricos e eletrônicos para uso em aviação) dos caças F-5 da FAB, por exemplo, a Embraer e a israelense Elbit estão levando US$ 290 milhões.

Viegas, por meio de sua assessoria, disse que não deve haver custo extra. “O avião não é só a plataforma. É uma estrutura complexa, que permite a participação de diferentes tipos de indústria. A avaliação é que não se produzam custos adicionais, uma vez que todos os concorrentes estão cientes das regras da compra.”

Frente à frase de Viegas, os olhos se voltam também à Avibrás, que oferece em conjunto com a russa Rosoboronexport o avião que foi considerado o melhor em termos operacionais pela FAB, o Sukhoi Su-35.

Sediada em São José dos Campos (SP) como a Embraer, a Avibrás notabiliza-se no trato de sistemas de armas. O Brasil não produz o produto principal na área, o míssil de combate fora de alcance visual, e os russos prometem transferir integralmente a tecnologia ao país e vêem na Avibrás o lugar ideal para tal serviço. Além disso, prometem construir um centro para a integração no país, algo considerado difícil pelos analistas da FAB.

Dúvida semelhante recai sobre o anglo-sueco Gripen, oferecido pela Saab/BAe Systems. A empresa fala de integração “onde a FAB quiser”, segundo o diretor Erik Hjelm. O avião é considerado inadequado para as características do Brasil por ter alcance curto, mas apresentou uma oferta de compensação comercial que o coloca sempre na lista dos bem cotados da FAB.

A Comissão Interministerial que vai analisar a concorrência F-X e entregar um parecer político ao Conselho de Defesa Nacional, que decide o negócio, analisa cinco aspectos básicos na licitação: técnico, logístico, comercial, de contrapartidas e político.

Com a proximidade de sua decisão, a movimentação dos lobbies intensificou-se. Uma comissão de empresários russos, com o presidente da Sukhoi, Mikhail Pogosyan, esteve em Brasília reunindo-se com autoridades brasileiras há duas semanas.

Ouviu do comandante da Aeronáutica, brigadeiro Luiz Carlos Bueno, uma afirmação que chegou a preocupar a cúpula da empresa: que sua proposta comercial de contrapartidas de até US$ 3 bilhões poderia não estar sendo considerada.

A afirmação causou espanto porque a Sukhoi, assim como as outras concorrentes, foi convidada pela FAB a apresentar um ajuste de sua proposta final em novembro -isso porque a licitação ficara congelada por um ano, sob a alegação de que o combate à fome era a prioridade do governo Lula, na verdade um diversionismo para reestudar as propostas.

Em outra trincheira, Për Nuder, segundo homem do governo sueco, esteve em contato com empresários e autoridades para defender o Gripen. Executivos da empresa lançaram ofensiva de mídia para falar mal do Sukhoi, que consideram um avião caro de ser operado.

Já Richard Singer, diretor para Américas da Lockheed, passou parte da semana passada em Brasília, e não exatamente para ver o Carnaval. Seu aparelho, o F-16, é considerado na FAB como carta fora do baralho, assim como o MiG-29 -a Folha não localizou representantes do consórcio RAC, que oferece o caça russo.

Quem permanece em silêncio é a Embraer. Procurada pela reportagem, informou por sua assessoria que não faria comentários sobre a concorrência. Seu presidente, Maurício Botelho, já descartou em várias oportunidades a associação com outros concorrentes. A posição é compreensível, uma vez que, além de parceira no Mirage-2000BR, a Dassault é uma das donas de 20% da Embraer.

A posição rende críticas até da Lockheed, que concorre com o F-16, mas é sua parceira numa licitação nos EUA. Para o diretor Singer, “é pouco benéfico” o fechamento em copas. Resta saber se a Embraer considera o jogo ganho ou apenas está esperando o próximo movimento.

FONTE: IGOR GIELOW, Folha de S. Paulo – Fernando Valduga – Porto Alegre/RS

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